Até hoje me fascino com este RPG, mas confesso que no início
o via com certa estranheza. Já havia ouvido falar dele, já havia até visto ele,
porém, deveria ter lá meus 15 quando tive a primeira oportunidade de joga-lo.
Foi em um evento e fui jogar meio que desacreditado, pois não entrava ainda
muito bem como poderia ser uma aventura jogada como um bandeirantes. Era
interessante que nesta época eu já havia lido bastante histórias de lendas
brasileiras e até estrangeiras afins, mas confesso que eu ainda não conseguia
assimilar bandeirantes com as lendas do nosso folclore, ainda.
A mesa que joguei tinha o mestre mais quatro jogadores,
contando comigo. Se não me engano optei por jogar com um bandeirante lusitano
(personagem pronto) e tinha na mesa um outro bandeirante, um Índio e um Jesuíta.
Me lembro vagamente do mestre (mais de 15 anos, né), mas posso dizer que foi
uma das melhores aventuras de evento que joguei, com início, meio e fim (sem
correria e cortes de cenas). Lembro que tínhamos de nos embrenhar por uma serra
de mata fechada resgatar um influente jesuíta que havia sido sequestrado com
sua comitiva por uma tribo de indígenas canibais. Uma história simples que se
desenrolou incrivelmente com exploração, diplomacia com outras tribos, combate
com criaturas das selvas, com canibais e seus feiticeiros e etc. Aquela
aventura me fez ver com outros olhos o potencial do Desafio.
Não tive outra oportunidade de jogar o Desafio dos
Bandeirantes. Não tinha o livro nem conhecia quem o tinha. E hoje ainda
pretendo mestrar uma aventurinha no futuro próximo para acrescentar no
currículo, kkk.
O Desafio dos Bandeirantes
É um RPG de temática bem original, ambientada em um Brasil “Fantástico”
na época da colônia e das Entradas e Bandeiras. Foi lançada pela GSA em 1992,
mesma empresa que lançou o Tagmar. Ele foi o primeiro RPG a tratar de temas
nacionais, o primeiro de poucos com relevância.
Regras
Na criação de personagens, o jogador podia escolher entre as
raças: Branco (colonizadores tecnologicamente mais avançados – Lusitanos, castelhanos,
francos e etc.), Índio (tribos conhecedoras das florestas), Negros (povos
escravizados), Mulatos (Mistura da raça negra e branca) e Mestiços (Mistura das
raças branca e indígena). E as profissões podem ser: Guerreiro, Rastreador,
Ladrão, Jesuíta (sacerdotes catequizadores versados em medicina e combate ao
mal), Sacerdote Negro (Sacerdote dos Orixás), Pajé (líder espiritual indígena),
Feiticeiro Negro (feiticeiros temidos que tiram poder dos espíritos),
Feiticeiro de Ferro e Fogo (guerreiro mágico da raça negra) e Bruxo
(feiticeiros brancos fugitivos da inquisição). As profissões são restritas pela
raça que o personagem está jogando.
Os atributos básico são sete: Força, Destreza, Resistência,
Inteligência, Sabedoria, Carisma e Sorte. A determinação dos atributos é bem
interessante. A base dos atributos são determinadas pela raça do personagem (o
que varia entre 10 e 11), soma-se o ajuste da profissão que escolheu (ajustes
equilibrados entre negativos e positivos) e, por fim, joga-se 7d6 e cada
resultado sorteado deve ser locado em um atributo a sua vontade. A única
exceção é o atributo Sorte, que inicia com 0 e só é somado o d6 sorteado.
Existem ainda algumas características secundárias, como Velocidade de
Deslocamento e Resistência (PV).
O jogo também trabalha com mecânica de habilidades
(perícias). Cada personagem começa com 170 pontos que devem ser distribuídos
segundo uma regra (20pnts em Esquiva, 100 em Habilidades de Carreira e 50 em
Habilidades Gerais). Existem bastante habilidades, dando a possibilidade de
criar personagens bem diferenciados.
Os personagens que utilizam magia devem comprar suas magias
com os pontos de Habilidade de Carreira, o que eu acho muito interessante e
justo, além de bem plausível. As magias funcionam exatamente como um teste de
Habilidade (que explicarei adiante), porem custa pontos de Poder Magico,
determinado pela soma de Inteligência (conhecimento) e Destreza (habilidade).
Como estes pontos demoram a retornar (6 por dia), ele poderá gastar sua
Resistência para usá-la. É interessante também que as profissões possuem
diferentes formas de usar magia.
O jogo também tem um sorteio para classe social parecido com
Tagmar e o sistema monetário é o réis. As armas possuem dano ao estilo D&D
(rolagem de dados fixos), porem a armadura possuem concedem RD (enquanto não
forem inutilizadas).
As regras são bem explicadas, porem o modelo de teste não é
padronizado, o que pode confundir jogadores novatos. Para testar Atributos,
rola-se 1d20 e compara com o atributo, se menor, sucesso. Para teste de
Habilidades, rola-se 1d100 e compara com a habilidade, se menor, sucesso. Em
combate com Armas a Distância, rola-se 1d100 e compara com a habilidade, se
menor, sucesso. Em combates com Armas Corporais, rola-se 1d20 e soma-se à sua
habilidade e o alvo deve testar Esquiva (1d20+Hab), Escudo (2d20+Hab) ou Defesa
(1d20+Hab). O melhor resultado tem o sucesso (com algumas regrinhas casuais).
Esta falta de padronização nos testes que acaba dificultando o entendimento e a
fluência do jogo, mas nada tão difícil que não dê para se acostumar em algumas
partidas.
A Terra de Santa Cruz
A ambientação se passa na Terra de Santa Cruz, uma nova
terra inspirada no Brasil do século XVII. Isso mesmo, o Desafio dos Bandeirantes
não é ambientado no Brasil, mas em uma terra mística, um continente imaginário
onde habita criaturas fantásticas e mitológicas e onde a magia existe.
A ambientação, apesar de pequena (cerca de 20 páginas),
possui uma descrição muito bem feita e abrangente, dando ao mesmo tempo suporte
e liberdade ao mestre para adaptar qualquer característica da América Latina
Colonial. Temos índios de diversas tribos e até fantásticas, piratas, incas,
colonizadores espanhóis, portugueses, e etc, temos selvas, serras, pampas, pantanal,
minas, tudo aquilo que podemos encontrar de fascinante em nossas terras e dos
irmãos latinos. Absolutamente fantástico.
Após a ambientação vem uma lista de criaturas fantásticas de
lendas e folclores, regras para tesouros e também dicas de como fazer
aventuras. Um livro completo.
Hoje eu tenho a opinião que O Desafio dos Bandeirantes foi,
e é, um dos RPG’s mais bem feitos e originais que já tive contato. Trata de uma
ambientação pouco explorada, ainda mais por nós brasileiros. Temos o Hi Brasil
da Daemon, só que este é uma mistureba danada. Pela internet eu encontrei
algumas comunidades e blogs (a maioria desatualizada) e um perfil do face.
Seria legal se dessem ao Desafio uma nova edição aos moldes do Tagmar. Valeria muito
a pena!
Seeya